Não dá pra falar de arte no Brasil sem falar de Benjamin de Oliveira. O mesmo vale para qualquer discussão sobre circo e também empreendedorismo. Por ora, isso acontece porque sua história, valorizada por parte do movimento negro, foi esquecida (ou silenciada?) por grande parte da sociedade.
Numa tentativa de trazer mais visibilidade à sua múltipla carreira enquanto músico, cantor, dançarino, autor, compositor e diretor de uma companhia circense, o Itaú Cultural faz sua última ocupação de 2021 em homenagem ao artista e empreendedor que nos agraciou com suas obras entre 1870 e 1954.
A exibição promete, inclusive, que as obras, que totalizam aproximadamente 120 peças, são pensadas para públicos diversos, que incluem as crianças – coisa rara por aqui.
Conheça “BENJAMIN – O PALHAÇO NEGRO”
Benjamin de Oliveira
Nascido em Pará de Minas (MG), filho de uma mulher escravizada com o capataz da fazenda, ele tinha 12 anos quando, encantado pelo circo que havia visitado a cidade, fugiu com a trupe. Fez um pouco de tudo até se tornar palhaço, sete anos mais tarde. Por fim, um dos homens mais importantes para o desenvolvimento e a modernização do circo brasileiro. Ao acompanhar essa trajetória, a mostra resulta, ainda, em uma representação deste universo no Brasil, do final do século XIX ao começo do XX.
Entre cerca de 120 peças, a Ocupação Benjamim de Oliveira leva os adultos à infância e as crianças à diversão, entre jornais da época, muitas fotografias, audiovisuais, objetos circenses originais, livros, documentos e fonogramas de músicas interpretadas por ele e por seus companheiros de composição, como Mário Pinheiro, Eduardo das Neves, Catulo da Paixão Cearense, Chiquinha Gonzaga e Paulina Sacramento.
A curadoria é dos Núcleos de Artes Cênicas e do Observatório do Itaú Cultural. Erminia Silva, professora doutora em história, pelo núcleo circus da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), além de autora de obras como Circo-teatro: Benjamim de Oliveira e a teatralidade circense no Brasil, assina a cocuradoria. Editado pela Altana, em 2007, o livro ganhou versão revisada e será lançado em fevereiro de 2022 pelo Itaú Cultural e a editora Martins Fontes.
Neste colorido e alegre espaço, toda a iconografia e documentação colhida nos arquivos da família, pesquisadores e instituições dedicadas ao tema, se desenrola em torno de uma arena. As paredes do picadeiro reconstituem este universo, quando o século XIX transitava para o XX, desempenhando um papel que ia além da diversão, risadas, suspense e entretenimento. O período de atuação de Benjamim de Oliveira, ao lado das pessoas com quem conviveu e trabalhou, como João Alves, proprietário do Grande Circo Theatro Guarany, foi um tempo efervescente e de suprema importância para a popularização das artes cênicas, da música e do cinema no ambiente circense.
Assim, a mostra acompanha a trajetória de Benjamim que, além de se tornar palhaço, fortaleceu a introdução da linguagem teatral no circo estreando, em 1904, um texto dele próprio, O Diabo e o Chico. O sucesso foi tamanho que a partir dali a programação circense passou a contemplar as montagens teatrais com muito sucesso de público e crítica. Credita-se a ele muito do protagonismo no processo de ampliação do circo-teatro.
Alice Viveiros de Castro, pesquisadora e autora do livro O elogio da bobagem – palhaços no Brasil e no mundo, conta que Benjamim vendia doces e cocadas, quando ficou fascinado pelo circo e fugiu com um deles.
“Tinha 12 anos e não sabia fazer nada. Mas no circo sempre tem trabalho e pouco a pouco foi aprendendo a saltar, andar na corda, balançar no trapézio e nas argolas. Era o Circo Sotero e lá foi começando a ser artista. Fugiu do circo. O dono tinha ciúmes daquele rapaz bonito que a cada dia ficava mais esperto. Fugiu de um grupo de ciganos que queria trocá-lo por um cavalo. E como não conseguiu fugir de um grupo que queria prendê-lo como um escravo fugido, deu jeito usando sua arte. Fez todas as acrobacias que sabia e conseguiu provar que era um artista!”
De acordo com ela, Benjamim saiu rodando por Minas Gerais e São Paulo, indo de uma companhia circense a outra, até que um dia, quando ele trabalhava na de Albano Pereira, o palhaço ficou doente e ele foi convocado para substituí-lo.
Começou, assim, uma jornada que duraria mais de cinco décadas, durante as quais ele atuou nos palcos-picadeiros e bastidores. Além de palhaço, foi ginasta, acrobata, músico, cantor, dançarino, ator, autor de músicas e peças teatrais e diretor de companhia.
Entre os dias 27 de novembro e 27 de fevereiro de 2022, a Ocupação Benjamin de Oliveira estará no piso térreo do prédio do Itaú Cultural, na avenida Paulista.