“Deus? O mesmo Deus da Igreja é o do Candomblé. A África conhece o nosso Deus tanto quanto nós, com o nome de Olorum. A morada dele é lá em cima e a nossa, cá embaixo”.
Nas águas doces, foi lavada. Seu ori abençoou. Neta de nigerianos escravizados, aprendeu a ancestralidade. Irradiou beleza, bem como sua mãe Oxum. Ora iê iê ô. Foi abençoada. Vestiu branco. Cuidou das flores. Acendeu vela. Cantou ponto. Fez sacrifício.
Do Gantois. Gantois era Edouard, proprietário de navios negreiros. Foi dele a terra que virou terreiro. Hoje os donos são odús. 256 orixás reinam. Assim como reinaram na vida dela. O maior nome do candomblé no Brasil, Mãe Menininha do Gantois.
Quando criança, nomeou seus bonecos. Chamavam Oxum, Oxóssi, Ogum. Tinha outros, ainda. Mas também a nomearam. Foi sua avó quem a chamou “Menininha”. Era tão doce quanto as águas da mãe. Também pequena, sonhou com um erê. Era outra menininha que a levava às águas salgadas. Lá, assim como Oxum, entendeu os segredos dos búzios.
Tinha apenas oito anos. Foi iniciada no candomblé. Foi orientada pela avó, pelas tias e pela mãe. Aprendeu o axé. Honrou a história de sua bisavó, Maria Júlia da Conceição Nazaré. No século XIX, ela fundou o Iyá Omin Axé Iyamassê. Terreiro do Gantois. Restaurou o abá do povo de fé.
Com a morte repentina de Mãe Pulchéria, Maria Escolástica da Conceição Nazaré se tornou Mãe Menininha de Gantois. Foram os mesmos búzios do mar e da areia que a confirmaram Ialorixá. Mãe de santo.
Mãe Menininha sofreu perseguições. Com violência, policiais invadiam os terreiros. A Ialorixá foi presa por seguir sua fé. A intolerância e o desrespeito já existiam antes de Maria assumir o comando do ilê. Foi uma época dura. A opressão acabou tarde. Um governador da Bahia liberou as casas de Candomblé a exercerem seu axé.
Foi assim que a estrela mais bonita, o sol mais brilhante, a beleza do mundo, a mão da doçura esteve no Gantois. O consolo da gente abraçou a todos. Oferecia café ou comida. Oferecia o doce das águas de sua mãe. Foi Olorum quem mandou Mãe Menininha. Foi Olorum que a deixou aqui por noventa e dois anos. Para ser menina e mãe. Ser nossa mãe.