O que significa pertencer sendo uma pessoa negra em um ambiente dominado por brancos?
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A maioria das pessoas negras já estiveram na posição de ser a única pessoa negra dentro de determinados locais, seja no ambiente de trabalho, na faculdade, no restaurante chique e por aí vai. Foi esse incomodo e a sensação de não pertencimento que levaram a jornalista Isabela dos Santos, de 22 anos, a criar o projeto Pretos em Pauta, que discute a questão dos jornalistas pretos na Baixada Santista e comprova o que todos já sabiam, os negros ainda são a minoria.
Isabela estagiou na redação do maior jornal impresso da Baixada Santista e nessa época estava produzindo o seu trabalho de conclusão de curso sobre a pluralidade da raça negra. Ao perceber que a redação era composta por uma equipe majoritariamente branca e se envolver cada vez mais com a complexidade das questões raciais, ela começou a pensar no que seria o rascunho do projeto Pretos em Pauta. “Começou daí e esse ano nós tivemos a morte do George Floyd e a TV pautando essas questões raciais, o painel com seis jornalistas negros da Globo News e me deu mais vontade de trazer o tema à tona.” Ressalta a jornalista.
O projeto consiste em uma série de entrevistas por meio de lives feitas no perfil do Instagram da jornalista. Os convidados são diversos, como jornalistas formados que contam a sua experiências dentro do mercado de trabalho da Baixada Santista, estudantes da área que relatam a sensação de estudar em um ambiente cercados de brancos, da falta de professores negros nos cursos do eixo de comunicação, a invisibilidade da Imprensa Negra nas grades curriculares e também jornalistas brancos que falam abertamente da discrepância que ocorre nas redações. As lives ocorrem em dias e horários variados e vão ser realizadas até o dia 25 deste mês, mas todas estão salvas no IGTV, para acessar o conteúdo basta entrar no perfil @isa.jornalista.
A iniciativa vem sendo uma forma de provocar discussões e buscar um reposicionamento da grande mídia sobre as questões raciais. “Desenvolver o projeto está sendo uma experiência maravilhosa, um aprendizado e está sendo um estímulo para a jornalista que eu quero ser. Acho que eu estou me vendo mais enquanto jornalista. Por exemplo, trazer questionamentos à tona. É um tema que incomoda e eu estou falando da minha profissão e a nossa profissão não gosta de receber crítica”, destaca Isabela.
Além de causar um questionamento, para Isabela, o aprendizado também está em ouvir o outro e ter a oportunidade de conversar e interagir com jornalistas negros da região para criar uma conexão mais intensa. “Todas as pessoas negras, sejam elas consciente ou não da questão racial, elas carregam experiências, falas e conhecimentos que quando transmitidos eles te tocam de alguma maneira”, afirma a jornalista.
Quando questionada sobre qual a sua expectativa para o futuro das discussões raciais, Isa, como gosta de ser chamada, afirma que já está na hora de ações, que o futuro precisa se pensar mais negro com todas as diversidades da raça. “Nós somos 56% da população e já passou da hora da gente falar sobre e apontar. Eu quero muito mais que representatividade, quero contratação e medidas efetivas. Espero que a imprensa local se repense. O jornalismo precisa se pensar, o jornalismo está branco demais. Espero que um dia eu entre em uma redação e consiga me ver, não só pessoas com o meu tom de pele, mas também pessoas negras com tons mais escuro, com cabelo crespo, por nós negros também somos diversas. Eu quero pessoas negras nos espaços, incluindo nas redações.”